segunda-feira, 19 de março de 2018

A propósito da proliferação dos patos em Badajoz

A extraordinária multiplicação dos patos, num parque público da cidade espanhola e raiana de Badajoz, implica um olhar atento e crítico sobre duas outras cidades. Sobre Elvas, que é vizinha. Fica a apenas 8 quilómetros. Sobre Tomar, que fica mais longe, mas também tem patos. (ver foto)
De acordo com os dados recolhidos, Elvas é a cidade mais antiga. Foi conquistada pelos árabes em 714, que a baptizaram El Bash. Segue-se Badajoz, fundada pelo árabe Ibn Maruan em 798. Só três séculos e meio mais tarde, Gualdim Pais resolveu "começar a construção deste castelo por nome Thomar". 
Os séculos foram passando, nem sempre na paz do Senhor e, em 1864, Badajoz tinha 23.434 habitantes, Elvas 17.685 e Tomar 21.894. Tudo relativamente equilibrado em termos demográficos, nas três cidades do interior, das quais duas -Badajoz e Elvas- no interior profundo. A pelo menos 200 quilómetros da costa mais próxima. Tomar está a apenas 60 kms da Nazaré.
Passados 150 anos, o fosso é agora enorme entre a cidade espanhola e as duas portuguesas. Em 2011, Badajoz registava 151.565 habitantes, contra apenas 23.078 em Elvas e 40.677 em Tomar. Que se passou durante esse período, que provocou tamanho desnível? Certamente erros vários, a elencar e debater noutro local e noutro tempo. Por agora convém só tomar nota e não esquecer, porque nada acontece só por acaso.


Sobretudo para responder às usuais sumidades tomaristas, que vêm com a desculpa da interioridade, logo que ouvem falar da decadência de Tomar. Pior ainda, quando se lhes aponta o caso de Ourém, que também está no interior, mas vai crescendo e já ultrapassou Tomar, são rápidos na resposta: -É porque têm Fátima! Pois seja. Mas seguindo tal raciocínio, e perante o extraordinário desenvolvimento urbano e demográfico de Badajoz, dá vontade de perguntar: -Será porque não têm Fátima?
Frente a Badajoz, apenas separada pelo Guadiana, Elvas está ainda no mesmo escalão de Tomar, porém com duas diferenças fundamentais. Por um lado, parece já ter conseguido estabilizar a população. Tinha 19.679 eleitores inscritos em 2005, e 19.314 em 2017. Por outro lado, ousou encarar a realidade e procurou soluções. Decidiu assinar, em 2013, um convénio com Badajoz, sob a égide da União Europeia, que transforma aquele conjunto urbano na Eurocidade Elvas-Badajoz, tendo em vista os fundos europeus. "Se não os consegues vencer, junta-te a eles..."
-Então e Tomar, no meio disto tudo? perguntará você, alegando que o texto já vai longo. Tomar tinha 38.724 eleitores inscritos em 2009 e apenas 34.814 oito anos mais tarde, em 2017. Durante o primeiro mandato de Anabela Freitas, que depois disso já ganhou com maioria absoluta, desapareceram dos cadernos eleitorais 2.496 eleitores. Pouca coisa, é claro. Só 7,16% dos inscritos. A demonstrar que vai tudo bem no doce vale nabantino. E com nítida tendência para melhorar...
Falta a relação com os patos de Badajoz, não é? Pois vamos a isso. Naquela cidade raiana, de acordo com a reportagem do El Pais online, em apenas 3 anos, 40 patos deram origem a 500. Em Tomar, há mais de 20 anos que temos patos no rio. E até já houve cisnes. Cisnes, julgo que já se foram. E os patos, quantos são agora?
Como querem que se desenvolva uma cidade, cujas condições básicas nem sequer permitem que os patos se reproduzam? Ou haverá predadores desconhecidos, tal como acontece com os poluidores do Nabão? Inclino-me para esta hipótese.
Perante isto, seguir-se-à a usual reacção bem tomarense. Uma minoria concordará, os restantes discordarão. É normal em democracia, todavia anormal neste caso. Porque uma coisa é discordar de opiniões, outra bem diferente é recusar a dureza dos factos. Não acreditar nos factos, como dizia há uns dias Noam Chomsky. Quando se diz ou escreve, por exemplo, que a população está a diminuir, que há falta de investimento produtivo, ou que o ano passado houve fogos com muitas vítimas mortais, seria uma perfeita parvoíce discordar. Porque são factos indesmentíveis. Inconvenientes, mas indesmentíveis. Como neste caso dos patos, das populações e das condições de desenvolvimento.
Mas pronto. Para evitar quezílias, sempre nefastas, eu pecador me confesso. Admito, constrangido pelos inquisidores locais, que em Tomar está tudo bem; que vamos pelo caminho certo, uma vez que a senhora presidente até ganhou com maioria absoluta. Eu é que sou um velho rabujento, ainda por cima pessimista crónico. Insisto contudo, recordando Galileu: -E no entanto ela move-se! Mas quem é que nas margens nabantinas conhece o caso  Galileu, durante cujo julgamento pronunciou a célebre frase E pur se muove! ?!?
Quando por vezes vejo passar camiões carregados de suínos, todos muito calmos porque bem alimentados, penso para comigo: -Coitados! Se soubessem para onde vão... Mas provavelmente os suínos nem pensam de forma articulada, actividade que mesmo nos humanos tende a cansar um bocadinho a cabeça.
Haja saúde!

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